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Os Ombros Suportam o Mundo, Carlos Drummond de Andrade – Análise

  • Luciane Diniz
  • 26 de fev. de 2017
  • 3 min de leitura

Carlos Drummond de Andrade (1902–1987) foi um consagrado poeta brasileiro que nasceu em Itabira, Minas Gerais. Ele se Tornou um dos principais representantes da literatura brasileira do século XX. Os principais temas retratados nas obras de Drummond são: a família e os amigos, a existência humana, a visão sarcástica do mundo e das pessoas, as lembranças da terra natal e conflitos sociais. Não é diferente em seu poema “Os Ombros Suportam o Mundo”, publicado em 1940, no livro "Sentimento do Mundo".


A década de 1940 foi marcada pelo apogeu dos os conflitos armados que assolaram a década, com o holocausto, e declínio e com milhões de pessoas mortas. No poema de Drummond vemos sua visão sobre a então realidade, além da abordagem de uma importante questão social: a guerra.


Drummond estabelece sua descrença no mundo se mostrando sem esperança, como observado nos versos “Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus/Tempo de absoluta depuração.”. O poeta deixa transparecer em sua obra sua desilusão: “Em vão mulheres batem à porta, não abrirás./ficastes sozinho, a luz apagou-se”, sendo possível observar que mesmo a esperança, a única coisa maior que o medo, foi roubada do mundo depois de fatos desumanos atrelados as guerras. Na estrofe podemos observar que a experiência de vida daquele tempo torna os sentimentos inúteis. O homem não se surpreende com mais nada, não ama, não acredita em uma força superior, não chora e não ri, pois “o coração está seco”.


Trabalhando com o efeito da guerra na sociedade e nos homens, Drummond ainda nos apresenta uma realidade fria e sem cor, onde viver não passa de mais uma obrigação a ser cumprida, isto como forma de ter consciência e compreender tal realidade e não ignorá-la vivendo em um mundo utópico e divergente ao real: “Chegou um tempo em que não adianta morrer./ Chegou um tempo em que a vida é uma ordem./ A vida apenas, sem mistificação.”.


A vida é tratada com indiferença e os homens a vivem mecanicamente, sem sofrer, sem temer a morte e aceitar a existência sem nenhuma esperança, como analisado nos versos “És todo certeza, já não sabes sofrer. E nada esperas de teus amigos.”.


Ao final, Drummond faz um apelo ainda mais claro para a Segunda Guerra Mundial, dizendo que muitos ainda sofriam as consequências dela. Comparando o peso dos ombros com as mãos de uma criança, o eu lírico diz seguir com a vida e enfrentar essa triste realidade.


O discurso escamoteado de Carlos Drummond de Andrade nos permite analisar a relação do texto com o contexto de sua produção e sua observação da sociedade, sendo essa carregada de uma boa dose de pessimismo e ironia diante da vida.

Os Ombros Suportam o Mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus. Tempo de absoluta depuração. Tempo em que não se diz mais: meu amor. Porque o amor resultou inútil. E os olhos não choram. E as mãos tecem apenas o rude trabalho. E o coração está seco. Em vão mulheres batem à porta, não abrirás. Ficaste sozinho, a luz apagou-se, mas na sombra teus olhos resplandecem enormes. És todo certeza, já não sabes sofrer. E nada esperas de teus amigos. Pouco importa venha a velhice, que é a velhice? Teu ombros suportam o mundo e ele não pesa mais que a mão de uma criança. As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios provam apenas que a vida prossegue e nem todos se libertaram ainda. Alguns, achando bárbaro o espetáculo, prefeririam (os delicados) morrer. Chegou um tempo em que não adianta morrer. Chegou um tempo em que a vida é uma ordem. A vida apenas, sem mistificação.

-Carlos Drummond de Andrade


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